Mostrando postagens com marcador Poesia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Poesia. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Todo Dia, XXI - Poesia

.
outrobro

E se a vida
fosse uma longa tarde,
lânguida e quente,
em que os corpos se comprazessem
na solidão?

E se um outro outubro
fosse possível, quando
eu não ficaria sozinho,
quando não seria
outono a primavera?

E se o meu coração não fosse
um território desabitado,
sete palmos de terra fofa,
uma caverna vazia, aonde
os sentimentos vão
para morrer?

menos dor, mais amor

Acho que eu não nasci para ser amado,
somente para amar, sempre demais,
rápido demais, ansiando demasiadamente.
Me entrego com risco sempre calculado,
mas nunca previsto, em busca de algo que,
quando encontro, parece ser tudo que há
para encontrar, e quando perco
parece não ter sido
o suficiente.
Preferiria sofrer depois, pela falta súbita,
que ser sempre a parte prejudicada
pelo aborto dos sentimentos.
Mas será mesmo que eu não nasci pra ser amado?
e sim só para a poesia ruim
e o frio, desesperado encanto
da solidão?
.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Todo Dia, XX - Poesia

.
tradução pastoril


Sob a sombra da figueira, o poeta descansa,
Canta a vida, o amor, a morte,
Tange a lira, dedos tesos, se cansa,
Encanta-o a tarde...
Sobre os morros balem carneiros, andam duros;
Seus gemidos roucos, estridentes, ecoam pelo vale.
Os cascos batem na rocha, os sinos mugem.
Tudo vai, suave; um fauno leva as coisas pela mão.
No céu há as nuvens lanudas, o vento.
O mundo é o palco de seus versos sussurrados.
Tu, e também tu, não pensam nele nesse instante.
Mas ele pensa em ti, e uma sombra passa
por seu rosto iluminado.
O poeta toca e lança sua pergunta
Melodiosa aos carneiros: “Onde estás, minha Marília,
Que não te vejo pelas plagas?”
Ele toca e, saudoso, adormece, preocupado,
Vendo os carneiros indo embora, as nuvens indo embora,
O vento indo embora, o sol sumindo entre as colinas.
Pergunta por ti e vai-se, enquanto vós,
ó Marília, ó Títiro, enquanto vós
Vos amais, amenos, entre as folhas das figueiras.
.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Em L Letras

.
Há um tempo (eufemismo para um tempo grande que não é exato), ali nos links interessantes do blog, havia um com esse nome do título, "Em 'L' Letras", apelido que minha amiga, Le, do blog Tudo e Nada, dera ao "Em 50 Letras". Com o tempo aquela página acabou sendo abandonada pelos criadores, e eu tirei da lista. Agora eles voltaram, com um nome novo, Curta Linguagem, mas a mesma idéia: fazer poesia sobre temas variados com um limite de espaço, bem contemporâneo por sinal - um twitter poético avant la lettre, visto que o site ainda não existia na época que o blog foi criado. E tem um detalhe a mais: me convidaram para fazer parte da turma que escreve por lá. Então, pra encurtar a conversa, visitem o Curta Linguagem, é uma experiência interessante e que tem tudo a ver com nosso tempo.

Algumas coisas que eu já postei por lá.

TEMA: Título - Verso

ANIVERSÁRIO: Proporção - Encurtam os passos os anos longos.

PERGUNTA: Ciência, a Esfinge - Que fazer agora que todas as perguntas já foram respondidas?

ÁRVORE: Genealogia maldita - Os antepassados tocando o céu, os herdeiros afundando no chão.

REMÉDIO: Vida, modo de usar - Ama e lembra. Bebe e esquece. Cala e vai. Placebo do Desconhecido.

FEIJÃO: Os grãos como o tempo - Segundos, um após o outro, e no fim um caldo ralo para se aquecer.

A feijoada como a vida - Nunca completa sem os porcos e a ambulância.

CHAPÉU: Máscara - Sobre o couro calvo, o boné protege do sol e dos anos ignorados.
.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Omphalos

.
Escrevi isso se não me engano em 2006, talvez 2005. De toda minha antiga "produção" "poética", é talvez a menos execrável. Fiz uma alteração somente na quarta estrofe, substituindo os três últimos versos - os anteriores não faziam o menor sentido. Achei que ficou aceitável, mas talvez seja só condescendência nostálgica.

Flop, flop, flop.
Voa o passarinho!
Saindo de seu ninho,
O mundo viajar.

Flop, flop, flop.
Asas sobre o vento,
Sobre o tormento:
Seu outro-eu achar.

Voa, voa, bate as
asas da ternura.
Voa, voa, superando
as agruras.

Cede, vive, morre.
Dia após dia as nuvens passam,
O vento sopra, o sol brilha.
Corre, passarinho, corre.

Persiste, vive, insiste,
Comendo só alpiste,
Contando um causo, chiste
E forte ele resiste.

Pobre passarinho!
Nas asas da tormenta,
No olho do furacão,
Comida com pimenta.

Forte, forte, quente,
Sobrevive cruelmente.
Voando, voando, sempre,
Tal qual o seu tenente.

Nem é mais passarinho,
Ou outra ave no céu:
Humanos em seu ninho
Envoltos por um véu.

Ainda que de má
Qualidade a vivência,
Não permita que o mundo
Te faça bater continência.

Voe, voe, meu amigo,
Saia de sua caixa.
Pois se é árdua a missão
A tristeza só abaixa.
(Saia de seu umbigo.)
.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Todo Dia, XIX - Poesia

.
A Religião liberta; a Religião aprisiona.
O Conhecimento liberta; o Conhecimento aprisiona.
O Corpo liberta; o Corpo aprisiona.
A Morte aprisiona; a Morte liberta.

O mundo é feito
de dicotomias,
talvez equivalentes.
Dizê-las não é
reiterar o óbvio, mas
revelar a diversidade.

“Há verdade triviais
e há Grandes Verdades.
O oposto de uma verdade trivial
é simplesmente falso.
O oposto de uma Grande Verdade
também é verdadeiro.”
.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Todo Dia, XVIII - Poesia

.
almosting

“Queria que você estivesse aqui” -
Mais uma vez penso nessas palavras
Já tantas vezes repetidas,
Sempiternas portadoras
Do sentimento único,
Unicamente transmitido
Por “saudade” e “desejo”.

Caminho pela praia
Numa noite quase clara.
A lua, quase cheia,
Brilha alto no céu,
Quase coberta pelas nuvens.

Caminho pela praia,
E a noite é quase fresca.
O vento sopra fraco
E as ondas quase tocam meus pés,
Mas o calor não vai embora,
Fica, quase me fazendo tirar a camisa.

Caminho pela praia,
E lembro do dia, quase tudo:
Fez muito sol e a água estava ótima,
Assim como a comida da minha tia
E sua rede.
Estamos aqui já há três dias
A viagem está quase perfeita.

Caminho pela praia, quaseando,
Incompleto sem você,
E chuto um montinho de areia,
Quase acertando minha irmã,
Entristecido pela tua ausência.
.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Todo Dia, XVII - Poesia

.
genealogia amorosa

Primeira vez:
Atrapalhado despertar de sensações.
Não lembro direito, agora,
Como foi a primeira vez que me apaixonei.
Lembro dela: seu rosto, suas palavras, suas idéias;
Mas foi tudo ilusão: a conheci na rede,
Nunca a vi pessoalmente.
O rosto era uma imagem, as palavras digitadas, idéias vaporosas.
Tínhamos amigos em comum, conversávamos em grandes chats,
E também a sós, nós dois, cada qual sozinho atrás da tela.
Lembro-me do sobrenome dela,
Que eu, tão insistentemente, juntava ao meu.
Um dia, me declarei: torrentes de palavras.
Mas ela não queria nada, claro, com alguém tão distante.

Segunda vez:
Amiga de amigos, amiga minha depois.
Estudamos na mesma escola, mas só a descobri após conversarmos,
Longamente, pelo Messenger ao computador.
Nos víamos raramente, tête-à-tête, e eu sempre ficava envergonhado.
Desabafei com amigos e amigos e amigos,
E a história se espalhou. Chegou até ela,
Que não disse nada. Convenceram-me a declarar-me,
E acabar com o sofrimento.
Virando-me pra dentro, coloquei-me à sua frente,
E disse, entrecortadas, as tais palavras.
“Eu gosto de você, mas como amigo.” – é claro,
Por isso eu já esperava.
Restaram-me os três textos que escrevi inspirado pela paixão,
E a lágrima que não consegui derramar.

Terceira vez:
Mal a vi ao vivo, um vulto sempre imaginado.
Enquanto pensava me envolver,
As longas conversas na rede,
Ela permanecia fria, até mesmo sem amizade.
Enquanto vivia essa paixão, escrevi muito,
Frutos de sonhos e da imaginação.
Mudei de estratégia: declarar-se é do passado.
Chamei-a pra sair, uma, duas, três vezes.
E ela aceitou todas.
Mas sempre, no dia anterior, surgia algo que nos impedia de encontrarmo-nos,
E ela vinha me contar, tranqüila, mal disfarçando
A desculpa que eu sentia ali.
Desisti, mandei tudo pro espaço, se ela não quer fazer o que...
(Mas doeu.)

Pensei que a fonte dos meus fracassos
Era fundar a paixão na ilusão de conversas virtuais:
Parei, quase totalmente, de conversar pelo computador,
E parei também de me apaixonar.
Terá sido uma proteção que o meu coração levantou
Para defender-se dos assaltos da negação?

Não, aconteceu de novo.
Nada de internet, só ao vivo, mas ainda mais fraco que das outras vezes.
Não escrevi, tampouco, nada sobre esse amor,
Nenhum registro ou desabafo.
Minha paixão deixou de se erguer sobre a ilusão virtual,
Ou a imaginação dos escritos, e passou a erguer-se,
Mal se equilibrando, sobre a existência efêmera das palavras ditas
E dos encontros temporais.

Não recebi, ainda, o não,
Mas ela parece se afastar na direção de outro alguém;
E enquanto vejo isso penso
Se meu destino será mesmo a solidão,
Ter a companhia amarga das esperanças e dos sonhos,
Enquanto ao meu redor seres vivos se unem e separam,
Aproximam-se e distanciam-se, vêm e vão.

E por fim penso ainda, antes de abandonar-me no colchão,
Se essas minhas paixões não foram outra coisa,
Um desejo só mal concebido,
Um apego excessivo,
Uma necessidade ainda não suprida,
E enquanto o último espasmo de dor me atravessa o coração,
Conclusão dramática de uma nova paixão,
Decido, sucinto:
Amor é obsessão.

(Mas agora já passou,
E essa última estrofe parece tão ridícula...)
.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Todo Dia, XVI - Poesia

.
SCIENZA NUOVA

Ai!, Musa, não mais dá aos poetas tua Graça,
Desde o tempo dos deuses e dos heróis,
Que conquanto estivessem aqui cantavam,
Espalhando pelo pó o brilho de suas vozes.

O mero estalar da língua do aedo
Bastava ao povo para parar e ouvir,
Em silêncio, a rapsódia inspirada por ti,
Musa, que se enlaçava nos braços dele.

O homem nobre, em vigília, erguia os olhos,
E vendo a luz via-te, a bela forma de todas as palavras,
E sua língua era desatada, e a canção fluía de seus lábios,
Como o vento sopra nas oliveiras e os pássaros nos bosques.

O tempo, porém, esse senhor a quem até ti deve obediência,
Faz marchar a história, e os Deuses e Heróis ficam para trás,
E já não te apaixonas mais por aqueles que cantam.
Dão-te presentes os mais belos, em busca de seu amor,
Mas só o que fazes é tornar a cabeça, indiferente,
Desdenhosa daqueles artifícios e das belezas dos Homens.

Prosto-me agora diante de ti, pois, Musa,
Oferecendo meu coração e minha alma em sacrifício,
Esperançoso de que assim possa tirar-te dessa tua indiferença.
Servistes aos Deuses, servistes aos Heróis, mas não queres servir
Aos Homens. Se não aceitardes os presentes que ofereço,
Restar-nos-á o Fim, e somente isso: a Estrada de um novo recomeço,
A chance de trazer de volta os Deuses, para que enfim derreta
Teu coração, e a Canção volte a se espalhar pelo Mundo,
Ainda que o Mundo seja consumido pelo Fogo e pela Dor.
Pois então: Ricorso! E assim nós vamos! Que assim seja.

*

(contém easter-eggs.)
.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Todo Dia, XV - Poesia

.
DOIS POEMAS SOBRE NOSSA PEQUENEZ

Lembra-te de que és pó,
Lembra-te.
Lembra-te do sofrimento,
Lembra-te.
Lembra-te da hora das dores,
Em que perdeste tudo aquilo que amavas,
E não pudeste encontrar um nada além
Para te apoiar.
Lembra-te das lágrimas,
Lembra-te da finitude,
Do tempo que passa,
Da efemeridade de qualquer coisa,
Do aquecimento global,
Das tiranias,
Das tragédias,
Dos massacres,
Da crueldade e do mal nascidos em corações simples,
De todo o sangue derramado,
Lembra-te.

Agora, que já te encolhestes,
Sentindo no estômago
A angústia e a dor,
Ergue os ombros,
Gira o pescoço,
Levanta os olhos,
Vê o sol,
E esquece-te de tudo.

*

Levanta a cabeça,
Supera a tua insignificância,
E diz ao mundo:
“Eu sou.”
De que mais precisaria?
.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Todo Dia, XIV - Poesia

.
RETRATO DE UM VELHO SÓ

1- Com os mesmos raios
Que tocam meus olhos
Neste fim de tarde,
O sol banha
O apartamento
Até onde consegue entrar.

Parado na varanda, não me decido
Se fico ali ou volto pra dentro
Se permaneço em pé ou me sento
Ou se é melhor olhar para o sol até ficar cego.

Passos lentos, e estou aqui de novo,
A sala parece cansada, cheira a mofo
E recende, ainda, ao odor do cão,
Que ela lutou tanto tempo para ter.

Agora ela não está mais aqui,
Nem ele. Mas em meu passear sinto-os:
Seus cheiros, o peso dos dois sobre o chão,
As vozes que nunca deixaram de se esconder, ecoando,
Nos cantos do teto.

Eu gostava tanto de você
Sem roupa, inteira nua sobre a cama,
Me chamando para seus braços.
Mas depois dele não estávamos nunca a sós,
Éramos sempre três, eu, você,
E o cão, deitados na cama, olhando o teto,
Sem fazer nada.

E um dia quando você já tinha esquecido
De que uma vez deitara nua sobre a cama -
Eu já me conformara de não te ter mais só para mim –
Desnudaram-te mais uma vez, alguém que não tem nome,
Pela última vez tirando sua roupa, até aquela
Com que nascera, e mandando-te para longe.

Perdi o sorriso, minha voz ficou fraca.
Ficamos eu e o cão nos encarando durante meses,
Até ele fugir não sei como do 11º andar,
E eu não ir atrás dele procurando-o.

Sobrou-me de ti a cama, e o apartamento,
Esse lugar onde agora estou.
Vou dando passos, e lembro-me de muitas coisas,
Mas não de tudo.

2- Quando tenho fome, ligo o microondas
E esquento uma lasanha
Ou outra comida congelada,
Uma das que atulham o freezer
Desde que você partiu.

Nunca aprendi a cozinhar, minha mãe não me ensinou,
Nem você, que sempre sorria ao espetar o bife na panela.
No domingo você me perguntava o que eu gostaria de comer,
Tão gentil, e generosa preparava o arroz, o feijão, a carne assada,
Ou às vezes macarrão e peixe quando tínhamos vontade.
Depois, durante a semana, era a mesma coisa:
Você esquentava a comida do domingo e íamos comendo,
Pouco a pouco,
Todos os dias.

No sábado eu te levava para comer fora, no restaurante que você
.[escolhesse,
E ficávamos conversando a tarde toda, olhando os carros passar,
E falando sobre o tempo e a vida.

Agora, que você não está mais aqui, o cheiro de comida não preenche
.[mais o apartamento.
A Sra. Fernandes, uma moça muito boa do andar de baixo,
Faz as compras do mês com o dinheiro que lhe dou,
E às vezes me leva ao médico, quando preciso.

Ela nunca me cobrou nada em troca disso,
E os olhos dela me lembram dos seus.

3- O apartamento que compramos é bem comum:
- Dois quartos, um para o filho que nunca tivemos.
- A cozinha, branca e pequena.
- A sala de visitas e da TV,
Cuja tela apagada, repleta de poeira,
Não se acende há muitos meses.
- Um lavabo, atulhado agora de velharias,
E o banheiro, onde nos encontrávamos pela primeira vez após
.[o sono,
Os rostos estranhos, tortos, amassados pela noite,
Lentamente se abrindo a alguma luz,
Alguma espécie de rejuvenescimento na mansidão da manhã,
Enquanto nos olhávamos, as pálpebras caídas,
E pensávamos um no outro.

Hoje fico nos quartos, nos dois,
Lendo até me cansar, e depois deitado,
Simplesmente, olhando para o teto cheio de manchas,
Tentando me lembrar de onde elas vieram.

4- Não tenho saído daqui,
Do apartamento.
Esse lugar me cerca.

Dizem que a vida é curta,
Mas eu me lembro de tanto,
E há tanto ainda por lembrar...

Dizem que o passado não volta,
Mas é só ele que volta, só ele que permanece.
O presente não existe, é um lugar limítrofe,
Sem largura ou comprimento,
Entre o que vem e o que foi.
E meu futuro se esvai, diminuindo lentamente,
Até que encontre a aniquilação na frieza de um túmulo.

Só o passado existe, só o passado conta,
E todo o meu passado está aqui,
Entre essas quatro paredes,
Perdido no meio dos cheiros que não se vão,
Dos sons que não se vão,
Das imagens que não se vão,
Das sombras que permanecem.

Uma bola de ferro está atada ao meu tornozelo,
Mas eu não posso vê-la.

5- Não posso sair,
Não posso.
Tudo o que eu tenho está aqui.

Estou na varanda, o sol se põe.
A mente brilha, cheia de memórias,
E depois degrada, até a escuridão.

Eu estou aqui, não posso sair.
Só a esse ponto posso chamar de lugar.

Irreversível, o espaço.
Reversível, eu passo.

Everything alive dies alone.
Tudo vivo morre só.
.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Todo Dia, XII - Poesia

.
TENTATIVA DE SONETO


Parado eu estava, como uma pedra,
Esperando quieto onde o tempo medra.
Avistei no longe uma luz alvar:
Era o destino, vindo me salvar.

Cabisbaixo estava, de olho na morte.
Quando vi a luz, dei um grito forte.
O destino, pobre, ficou assustado
E eu sozinho, pois havia gritado.

De tijolo em tijolo, o muro sobe.
Ele envolve enfim a consciência esnobe.
Consciência minha, a consciência vossa:

Ainda que crente de que tudo possa,
Não será capaz de vencer o lobby
Dos grilhões ferrados dessa alma nossa.
.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Todo Dia, XI - Poesia

.
An-ti-cons-ti-tu-cio-na-lis-si-ma-MEN-te.
Adjetivo verbal superlativo de quem desafia a constituição.
Tem tantas sílabas poéticas que ocupa um alexandrino quase-inteiro–
Inteiro, se acentuado no TE.

Constituir
Constituição
Constitucional
Constitucionalíssimo
Constitucionalissimamente
Anticonstitucionalissimamente
u.s.w.

A história de uma palavra
diz muito sobre ela.
.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Todo Dia, X - Poesia

.
Decidi escrever um poema
Com versos, e rimas
E tudo

Não é o que eu faço melhor, eu sei.
Sempre digo: “Não sei escrever poemas.”
Mas tudo bem,
Vou escrever mesmo assim.

É claro que não vai ser uma obra-prima.
Aliás, é provável que seja ruim mesmo,
No sentido medíocre e inescapável da ruinzice.

Mas tudo bem.

É só um poema, ninguém vai ler, e tal.
Não precisa ser bonito.
Nem lírico.
Nem rimar.
Nem ter ritmo.
Nem revelar o segredo profundo escondido nos corações humanos
.[enquanto eles se perdem construindo para si mesmos imagens que
.[os outros vão ver de maneiras completamente diferentes das que
.[eles imaginam.
Nem ser um poema, de Verdade.
Nem nada.
.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Citação de Sexta: Contemplai as minhas obras, ó poderosos...


“I met a traveller from an antique land
Who said:—Two vast and trunkless legs of stone

Stand in the desert. Near them on the sand,

Half sunk, a shatter'd visage lies, whose frown


And wrinkled lip and sneer of cold command
Tell that its sculptor well those passions read

Which yet survive, stamp'd on these lifeless things,

The hand that mock'd them and the heart that fed.

And on the pedestal these words appear:

'My name is Ozymandias, king of kings:

Look on my works, ye mighty, and despair!’


Nothing beside remains: round the decay

Of that colossal wreck, boundless and bare,

The lone and level sands stretch far away.”

- Percy Bysshe Shelley, Ozymandias
.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Dover Beach - Matthew Arnold

.
"
The sea is calm tonight.
The tide is full, the moon lies fair
Upon the straits; on the French coast the light

Gleams and is gone; the cliffs of England stand,

Glimmering and vast, out in the tranquil bay.

Come to the window, sweet is the night air!

Only, from the long line of spray

Where the sea meets the moon-blanched land,

Listen! you hear the grating roar

Of pebbles which the waves draw back, and fling,

At their return, up the high strand,

Begin, and cease, and then again begin,

With tremulous cadence slow, and bring

The eternal note of sadness in.


Sophocles long ago

Heard it on the Ægæan, and it brought

Into his mind the turbid ebb and flow

Of human misery; we

Find also in the sound a thought,

Hearing it by this distant northern sea.


The Sea of Faith

Was once, too, at the full, and round earth’s shore

Lay like the folds of a bright girdle furled.

But now I only hear

Its melancholy, long, withdrawing roar,

Retreating, to the breath

Of the night wind, down the vast edges drear

And naked shingles of the world.


Ah, love, let us be true

To one another! for the world, which seems

To lie before us like a land of dreams,

So various, so beautiful, so new,

Hath really neither joy, nor love, nor light,

Nor certitude, nor peace, nor help for pain;

And we are here as on a darkling plain

Swept with confused alarms of struggle and flight,

Where ignorant armies clash by night."

.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Sem título.

Poesia não é nem nunca foi meu forte. Entretanto, dessa vez não pude resistir. Um surto criativo (demônio ou musa?) se apossou de mim e escrevi esse monte de versos de uma vez só. Por favor, não me peçam métrica, ordem ou rima... como eu falei, sou uma negação pra isso. Mas tentem apreciar a matéria bruta. Nem cheguei a revisar. Pus tudo no "papel" e agora boto aqui. Opinem por favor... nem que seja pra dizer que é a pior coisa sobre a qual já tiveram o desprazer de deitar os olhos. Aliás, seria realmente bom que alguém interessado sugerisse algumas alterações... eu sei lá, sempre há espaço para melhorar algo. Nesse caso, melhorar muito.

Ademais, preciso de uma título. Sugestões?

_______________

Eu preciso do silêncio e do nada.
Preciso das noites ruidosas sem companhia
E das paredes altas e nuas, indiferentes
Ao tiritar dos meus ossos e meus olhos
Como pássaros empalhados e como
Porcos, chafurdando na lama.

Eu preciso da lama, e das esquinas.
E quero as grades se fechando
Enquanto a luz difusa oscila,
Fustigando meus olhos inocentes
Com seus laivos raivosos
De excitação juvenil.

Eu preciso de purgação e de fogo.
De espinhos que me firam a carne
E de remédio que saiba curar
A mácula dos meus pecados antigos,
Das minhas dúvidas primordiais,
Meus dilemas diluvianos.

Eu anseio por uma visão,
Por um sinal, com o qual
Triunfarei sobre todos os
Inimigos da terra e de mim,
Mantendo-os próximos até
A hora final, a hora das horas
Se reunirem e jogarem nas
Mãos do destino a decisão
Sobre as vidas e as mortes
Dos crentes e dos descrentes
Dos certos e dos indecisos
Dos eus e dos outros.

Eu preciso, e quero, te encontrar.
Seja por acaso, seja por obra
De algum artesão de passos,
Que nos esculpa os nossos
Na mais pura matéria da qual
Serão feitos os nossos sonhos.

E que nos esculpa também como colossos,
Nos dê envergadura própria de gigantes
E um ar e nobreza daqueles dos titãs.
Que nos diga que seríamos como os deuses,
Se não fôssemos tão humanos e tão mortais.
Como nunca houve nem haverá jamais.

E assim, brilhantes eternos e imortais,
Ascenderemos aos céus, envoltos
Por hostes sem número de anjos e fadas.
E seu véu será levado por miríades de ninfas,
E nossa carruagem será levada por
Cavalos flamívomos octópodes.

E nossa voz será o trovão, e nosso
Beijo o a concepção de mundos.
E nossos olhos se apertarão de espanto
E as mãos se abrirão de medo,
E o que era doce então se apagará,
E o fogo da memória futura já não será mais.

E seremos dragões, dragões alados
Com a luz do sol coroados
Pela espada de reis abençoados
E talvez percorramos juntos os ares imprecisos
E talvez mergulhemos juntos no mar bravio
E nadaremos, e ao frio mais estático desceremos
Continuando a nos fechar e morrer
Até afundarmos no lodo das profundezas.