No início de O Leopardo, o pano de fundo da história nos é explicado rapidamente em um letreiro: por volta de 1860, Giuseppe Garibaldi lutava pela unificação italiana, desejando fundar a República e combater a aristocracia decadente. Depois, uma frase arremata: é preciso que as coisas mudem para que tudo possa permanecer igual.
Enquanto isso, ouvimos o rumor de várias pessoas repetindo o que depois se descobre ser o terço, em latim. Uma família inteira, de joelhos, reza, mas logo uma gritaria do lado de fora da sala onde estão os incomoda, e o terço é encerrado. Vem então alguém trazer a notícia: há um soldado morto no jardim. E uma carta para o patriarca os alcança no mesmo momento. Trata-se de um outro nobre, que vai se refugiar com a própria família em um navio inglês, procurando segurança frente aos soldados de Garibaldi.
Sim, estamos na Sicília, no período do Risorgimento, e a aristocracia está com medo. Dom Frabrizio de Salina (Burt Lancaster, numa interpretação soberba) decide ir com a família para o feudo de Donnafugata, a fim de se protegerem de eventuais problemas com os rebeldes. Antes disso, porém, seu sobrinho, Tancredi (Alain Delon), dá a ele a notícia de que irá lutar ao lado de Garibaldi, e profere novamente a frase que já aparecera no início do filme: “É preciso que as coisas mudem de lugar para que permaneçam onde estão.”
Em Donnafugata, Fabrizio conhece Dom Calogero, um burguês riquíssimo, mas sem cultura, representante de uma classe nova, desconhecida. É com a filha de Calogero, Angélica (Claudia Cardinale), que Tancredi acabará por se casar. Eis aí, no casal, uma das imagens centrais do filme: a aristocracia pobre e decadente se unindo à burguesia rica e poderosa. Isso será tratado novamente, e com mais intensidade, na longa seqüência que fecha o filme, um grande baile onde burgueses e nobres dançam juntos, comem juntos, conversam, se unem, enfim, movem-se, saem de seus lugares, rearranjam suas posições, para que tudo, de maneira geral, possa permanecer como era antes.
O filme é esteticamente belíssimo. As paisagens parecem se expandir com os enquadramentos de Visconti, a música de Nino Rota parece ter existido junto ao filme desde o início dos tempos, e as atuações são todas perfeitas. Adaptado do romance de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, O Leopardo não é inteiramente fiel ao livro. É, porém, uma obra extremamente pessoal de Visconti.
O tema da decadência, seu preferido, está impregnado em cada fotograma. Um clima de melancolia rege todo o filme. Enquanto acompanhamos os acontecimentos, estamos sempre olhando para eles com o olhar de Dom Fabrizio, um olhar abatido, triste, de mero espectador, impotente, consciente de sua própria derrocada. Perto do fim do baile, Fabrizio dança com Angélica, celebra a união de dois mundos, do novo e do velho, da vida e da morte, e depois se retira para o banheiro, onde, encarando o espelho, deixar cair uma lágrima. Sai então da festa e vai caminhando por vielas estreitas, até entrar num beco escuro e desaparecer na escuridão, levando junto a antiga ordem das coisas.
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quinta-feira, 28 de agosto de 2008
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