Até suas cenas finais, O Planeta dos Macacos não passa de uma ficção-científica tradicional, ainda que muito bem executada. A sociedade humana é emulada (na sociedade símia) e criticada como na maioria das outras obras de ficção-científica padrão, enquanto uma história um tanto quanto familiar se desenrola sobre esse pano de fundo. Até que uma revelação final mostra que o que estávamos pensando até então era ingenuidade, perto da verdade que o filme coloca. Vejamos...
Quatro astronautas estão em missão de exploração no espaço, viajando à velocidade da luz. Como prevê a teoria da relatividade, enquanto eles pouco envelhecem, na Terra já se passaram séculos. Um acidente, porém, joga a nave em um planeta desconhecido, e os viajantes descobrem que um deles, a única mulher da missão, morreu devido a uma falha no sistema de preservação da nave. Os sobreviventes então escapam do veículo e começam a andar pelos arredores tentando encontrar vida (inteligente ou não). Acabam encontrando um grupo de seres muito parecidos com humanos, com a diferença de que estes não conseguem falar.
Nessas primeiras cenas (que cobrem quase meia hora do filme), já temos os primeiros indícios do que nos espera no final: enquanto caminham pelo deserto, os companheiros discutem os motivos que os levaram àquela viagem, e acabam manifestando entre si o desprezo que sentem pela própria raça. Contudo, mesmo tendo perdido a nave e com ela qualquer chance de voltar para casa, um dos astronautas finca no solo do planeta desconhecido uma bandeira dos EUA, e o comandante da missão, o capitão Taylor (Charlton Heston), ao avistar os humanos primitivos, afirma que em seis meses os três tem condições de estar dominando o planeta, sobre aqueles seres inferiores.
É aí que o filme muda de rumo, com a aparição de macacos armados e montados em cavalos que caçam os humanos, e acabam por matar um dos astronautas e prender os outros dois, capitão Taylor incluso. A partir daí, conheceremos a sociedade símia, que possui elementos primitivos e avançados, e uma grande semelhança com os humanos: os macacos estão divididos em castas, possuem ciência, religião, tirania, traição... há entre eles pessoas curiosas e outras medrosas, alguns que querem descobrir e outros que querem esconder a verdade. Há uma curiosa inversão de papéis, que remete aos houyhnhnms e aos yahoos de As Viagens de Gulliver: enquanto os macacos são avançados, os humanos são primitivos, e estes são dominados e exterminados por aqueles.
Tudo isso nos leva a sentir certa repulsa pela sociedade símia, e torcer para que Taylor consiga escapar, e Zira e Cornelius, seus aliados chimpanzés, consigam revelar a verdade sobre a história da raça primata. Até que somos tirados do ambiente dos macacos e levados até uma região desértica, onde macacos e humanos (Taylor e sua companheira muda e subserviente, hmmm...) se encontram e tem a chance de descobrirem algumas coisas. Zaius, o orangotango poderoso que até então parecera um vilão insidioso, faz um discurso contra o homem, referindo-se a uma antiga profecia que falava sobre o quão cruel e terrível era o ser humano, sobre a maneira como ele matava o próprio irmão por prazer, luxúria ou ganância, sobre como o homem é uma praga e a despeito de toda sua sabedoria e inteligência não consegue fazer nada que não seja eclipsado por sua estupidez.
Nesse momento, tanto o espectador como Taylor estão um pouco confusos, espantados pelas palavras de Zaius. Taylor então abandona os macacos e segue pela praia junto com Nova, sua companheira. Após algum tempo, Taylor finalmente encontra seu destino, e descobre a verdade inegável: a Estátua da Liberdade em ruínas afundada na praia que ele encontra é a revelação definitiva. O mundo estranho em que ele havia chegado nada mais era que a própria Terra, dois milênios após o ocaso do homem, após o ser humano ter destruído a si mesmo e deixado a Terra ferida se recuperando lentamente.
Desse modo, o diretor Franklin J. Schaffner dá o xeque-mate: por pior que a sociedade dos macacos parecesse a princípio (ou melhor, do ponto de vista de um humano), ela chegava a ser uma utopia perto do que a sociedade humana foi (no tempo do filme; para nós, do que a sociedade humana é), e do que ela fez (faz) para si mesma e para o planeta. Sombrio e pessimista, sem dúvida, mas também muito contundente, cada vez mais contundente nos nossos tempos apocalípticos.
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