quinta-feira, 27 de novembro de 2008

O Mensageiro do Diabo

O Mensageiro do Diabo (The Night of the Hunter, 1955) é um filme único em muitos sentidos. Em primeiro lugar, foi o primeiro e único filme do consagrado ator Charles Laughton. Embora seja hoje considerada uma das grandes obras-primas do cinema, O Mensageiro do Diabo foi um fracasso de público na época do lançamento e acabou sepultando a carreira do promissor cineasta.

Em segundo lugar, a parte técnica do filme também é única. A fotografia é uma união magistral do expressionismo alemão e do noir, com fortes contrastes em preto-e-branco. Os cenários tem um papel importante na história, e ajudam a expressar as idéias envolvidas em cada cena.

Em terceiro lugar, a atuação do elenco principal também é única. Robert Mitchum, Shelley Winters, as crianças... todos executam perfeitamente seus papéis, o que ajuda muito a criar o clima fantasmagórico do filme.

Finalmente, há o enredo: original, único. Mitchum faz o papel de um pregador assassino de viúvas, Harry Powell, que conhece na prisão um ladrão e quando sai de lá vai atrás da família dele com o intuito pegar o dinheiro para si. A história se desenrola, a partir daí, como um conto de fadas sombrio e violento. De fato, todos os acontecimentos são retratados, de uma certa maneira, a partir de uma visão infantil, o que acaba por tornar o filme maniqueísta.

Mas é justamente essa a premissa básica do longa: um embate entre o bem e mal, simbolizado nas mãos do pregador de Mitchum, onde se lê “Love”, em uma, e “Hate”, na outra, e na própria história que ele conta para conquistar a simpatia dos habitantes da cidadezinha onde mora a família do ladrão. Todo o filme está permeado de alegorias dessa oposição: o preto e o branco, as sombras e a claridade, o cargo santo de Powell e suas atitudes profanas...

A cena exemplar de todas essas singularidades do filme é a do assassinato da mulher do ladrão. Powell e ela estão no quarto, que é mostrado em forma triangular, como uma capela, mas uma capela maldita. A mulher, seduzida por Powell, e com a mente totalmente lavada, afirma saber que ele só está atrás do dinheiro, mas aceita isso de uma forma perturbadora. Powell, por sua vez, sentindo o perigo, saca sua navalha e com um gesto teatral a mata. A atuação, a fotografia, a música, o clima: tudo é magistralmente conduzido e executado.

Mas o filme, afinal, acaba sendo otimista em seu final, embora um pouco melancólico. As crianças, apesar de tudo pelo que passaram, se salvaram de seu algoz, e, embora tenham perdido o pai e a mão em tão pouco tempo, reencontraram uma família que os acolhesse e amasse. Mais conto-de-fadas impossível.
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