quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Pílulas Cinematográficas, Edição 5: Especial trilogia em língua inglesa de Antonioni

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Após um longo afastamento, o retorno: as Pílulas estão de volta! Embora elas tenham ficado muito tempo sem aparecer, voltam em grande estilo, falando de um dos grandes diretores de todos os tempos, Michelangelo Antonioni. Por trilogia em língua inglesa, refiro-me aos três filmes que o diretor fez para a MGM com produção de Carlo Ponti, todos falados em inglês. Ao contrário de sua trilogia anterior, porém, essa nova não tem uma forte ligação temática. Se na “trilogia da incomunicabilidade” o fantasma sempre presente era o da incapacidade dos seres humanos de se comunicarem, aqui não há um assunto que predomine. A incomunicabilidade continua presente, como por toda a carreira do cineasta, mas não é o assunto principal. O tema, penso eu, que mais se aproxima de estar fortemente presente nos três filmes é o da ilusão: ilusões diferentes entre si, mas com a mesma origem. Os filmes de Antonioni são filme difíceis, lentos, com um registro realista mas cheios de acontecimentos estranhos. Decifrar o que está por trás de tudo que está acontecendo é uma aventura muito estimulante. Por isso, recomendo desde já assistir a todos os filme sobre os quais falarei abaixo, pois eles merecem e precisam ser vistos.
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Depois Daquele Beijo (Blow-Up, 1966): De longe, o meu preferido dos três. Blow-Up se insere numa linhagem de filmes metalingüísticos que não falam de cinema, mas da fotografia. Basicamente, a ilusão aqui é a própria realidade: nem a tríade “Sexo, Drogas e Rock’n’Roll”, nem a fama e nem o dinheiro são capazes de tirar o protagonista, o fotógrafo Thomas, do tédio que assola sua vida. Finalmente, quando ele descobre algo que traz alguma emoção para ela, um assassinato que aparece por acaso em suas fotos, logo esse algo se esvai, some, como se nunca tivesse acontecido. É o dilema de Thomas: se a realidade é tão frágil a ponto de em algumas horas mudar de “crime hediondo cometido e fotografado” para “crime nenhum”, de que vale a realidade? Por fim, no jogo de tênis imaginário dos mímicos que encerra o filme, Thomas acaba por aceitar essa ilusão: ilusão que ele mesmo cria, não só pela lente de sua câmera, mas vivendo da maneira como vive.
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Zabriskie Point (Idem, 1970): Esse é o mais fraco dos três, e aquele em que o fator “ilusão” está menos presente. Porém, a cena final do filme vale por ele todo, é espetacular. O filme quer passar uma mensagem anti-sistema, anti-establishment, mas talvez acabe recaindo justamente na ilusão política, a ilusão da mudança: dois jovens envolvidos com movimentos estudantis e revolucionários se encontram e começam a se amar. Na cena que se tornou célebre, passada no ponto turístico que dá nome ao filme, uma espécie de cânion no deserto americano, os dois fazem amor, e esse ato se multiplica ao seu redor, resultando numa espécie de orgia metafísica ecoando por todo o lado. Logo depois, porém, um deles, o homem, acaba morto pelo mesmo sistema que combatia. E o outro, a mulher, que trabalha para alguém pertencente ao sistema, tem de ir até o lugar onde esse alguém está para fazer um serviço. Chegando lá, porém, vê que é uma mansão luxuosa, cheia de “mulheres fúteis” na piscina e homens-de-terno-e-gravata bebendo whisky e discutindo negócios. Então, num misto de ódio pelo sistema, pela perda do amado e pela própria vida, ela imagina a explosão da mansão, de cada milímetro da mansão, e de muitos ângulos diferentes. Contudo, embora sugira a imaginação, Antonioni não nos mostra o lugar após a “explosão”, deixando em aberto o que pode ter acontecido. Só o que ele mostra é o sol do deserto brilhando, apagando da memória e da terra a tragédia que até ali se desenrolara.
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Profissão: Repórter (The Passenger, 1975): Provavelmente o filme mais famoso de Antonioni, Profissão: Repórter conta com Jack Nicholson e Maria Schneider nos papéis principais. É o filme mais misterioso dos três, e conta com uma premissa originalíssima: um repórter, David Locke, que troca de identidade com um companheiro de hotel que morreu de enfarte, e depois descobre ser o companheiro um traficante de armas. A motivação dele a princípio não fica clara, mas depois revela-se como algo familiar: o repórter queria escapar de sua rotina, pois, apesar de viajar o mundo todo em sua profissão, ser casado, famoso, etc., não estava satisfeito. Neste filme, portanto, a ilusão mais uma vez respinga na rotina, mas tem como foco principal, porém, a identidade. A moça que o protagonista conhece em Barcelona nunca tem sua identidade revelada. Na penúltima cena do filme, um primor técnico, obra-prima por si só, travelling de sete minutos, Locke é morto por homens que talvez sejam enviados do governo para matar o traficante de armas que ele “é”, mas talvez não sejam. Assim, questionando a realidade da identidade, Antonioni nos presenteia com mais uma obra-prima.
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Um comentário:

john fletcher disse...

genial esse post sobre os filmes do antonioni. gosto muito dos três. só não concordo com o fato de zabriskie point ser tido como o menos dos 3. eu acho que ele faz um ótimo paralelo com cultura de massa. lembro-me de um livro chamado neurose, do edgar morin, que faz essa análise do politicamente correto e da cultura de bem estar e férias, a fim de esvaziar o homem. acho que o filme lida com isso.