segunda-feira, 3 de novembro de 2008

O Bandido da Luz Vermelha

Fazer cinema no Brasil definitivamente não é fácil. É uma velha questão imposta a todos os potenciais cineastas do nosso país: como fazer cinema de primeiro mundo, vivendo no terceiro? Muitas respostas já foram dadas a essa perguntas, mas uma das mais emblemáticas está na obra-prima de Rogério Sganzerla, O Bandido da Luz Vermelha.

Logo no início, os letreiros diferenciados anunciam um monte de informações, que serão retomadas em algum momento ao longo do filme: é o início de uma narrativa experimental e entupida das mais diversas referências. O cinema de Sganzerla é o marginal, a estética do lixo que surgiu principalmente entre os cineastas paulistas a partir da crise de representação referida no primeiro parágrafo.

Nós, brasileiros, vivemos no lixo... o Brasil é uma espécie de lixão continental.Em plena Guerra Fria (o filme é de 1968), a única “Guerra Total” com que nós, moradores da boca do lixo, temos de nos preocupar é aquela que já acontece em nossas cidades, a violência que está por todo lado. “O Terceiro Mundo vai explodir!”, proclama um anão profeta, e de fato: o amontoado de lixo que se acumula por toda parte vai acabar entrando em combustão, cedo ou tarde, e mandar tudo pelos ares.

No lixo, tudo está amontoado, fora de ordem, coisas das mais diversas origens estão juntas, unidas sem hierarquia, sem nenhuma espécie de organização. Para representar isso, Sganzerla fez um filme fragmentado, recheado de inúmeras influências, de pedaços do lixo que é jogado no terceiro mundo. A narração do filme remete, com um tom debochado, aos programas policiais do rádio. Há citação dos quadrinhos, da TV, de Godard... o filme é uma mistura bizarra e única da vanguarda e do popularesco, uma espécie de meio termo entre o cinema cabeça de Glauber Rocha e companhia e as pornochanchadas.

Ao mesmo tempo cômico, trágico, aventureiro, filosófico e pessoal, O Bandido da Luz Vermelha foi a solução que Sganzerla encontrou para fazer cinema no terceiro mundo. Sem os recursos – a tecnologia, o dinheiro, o aparato intelectual – do primeiro mundo, o cineasta foi longe para mostrar como o (seu) cinema do terceiro mundo é: uma mistura genial e estranha de tudo que vem de fora, que é jogado no lixão que chamamos lar. Como diz o personagem título, numa frase emblemática que resume bem a situação, "Quando a gente não pode fazer nada, a gente avacalha. Avacalha e se esculhamba."
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