quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Leituras: Outubro de 2008

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Esse mês, li um pouco mais que no último. Embora meu ritmo de leitura ainda não seja o que eu considero ideal, consegui ler três livros: dois romances e um livro filosófico. Gostei de todos, embora em diferentes níveis. Seguem abaixo os livros em ordem de preferência.

O Barão nas Árvores, de Ítalo Calvino: Calvino é um dos meus escritores preferidos. Sua prosa é leve, mas diversificada, e ele consegue mergulhar com extrema habilidade nos mais diversos temas da vida humana. Já falei aqui no blog sobre meu livro favorito dele, Se um viajante numa noite de inverno, mas O Barão nas Árvores se encaixa em uma outra linhagem dentro da obra do italiano. O romance faz parte da trilogia Os nossos antepassados, composta também pelos excelentes (e divertidos, e profundos) O visconde partido ao meio e O cavaleiro inexistente. Juntos, os três formam um conjunto ímpar, mas analisados caso a caso também são excepcionais. No caso de O Barão nas Árvores, acompanhamos a história de Cosme Chuvasco de Rondó, o rebelde filho de um barão que um dia resolve subir nas árvores para nunca mais descer. A partir daí, ele começará a enxergar muito melhor a vida dos habitantes daqui de baixo, e viverá sua própria vida sobre os galhos das florestas da Europa. Com um estilo composto por uma ironia fina e uma poesia irreverente, Calvino construiu nesse livro mais uma obra-prima encantadora, para ser lida e relida, e que possui um desfecho – em questões de enredo e forma – extraordinário e melancólico. Um dia posto aqui, para vocês verem.

Macunaíma, de Mário de Andrade: Uma aglutinação radical e anárquica dos Brasis, especialmente como eram vistos no início do século XX. Mário de Andrade reuniu aos poucos as mais variadas fontes de referências sobre o que havia no Brasil, e depois juntou tudo (com a ajuda dos sobrinhos) num livro que pode não ter pé nem cabeça, mas tem raízes fincadas profundamente no solo tupiniquim e estende seus ramos muito alto. Fazendo graça com a cultura popular e erudita, o folclore, a religião, a mitologia brasileiros, e até mesmo com a língua portuguesa, o escritor modernista fez uma obra-prima divertida e descompromissada, para ser lida dando risada e tentando fazer conexões entre as imagens que ele criou.

A Utopia, de Thomas More: Obra fundamental da nossa civilização, A Utopia é, embora muito citada, pouco lida. Não são muitos, que sabem, de fato, como é a sociedade que o filósofo imaginou. Eu, ao ler o livro, descobri, e, posso dizer, não é algo que mudou minha vida. Mas explico: a primeira parte do livro, que apresenta a discussão do interlocutor de More, Rafael Hitlodeu, com algumas pessoas em uma reunião na casa de um cardeal, é a que mais me agradou. Trata-se de um assunto extremamente (e infelizmente) atual, tratado com uma clareza e coerência de idéias impressionante. Entretanto, a descrição da Utopia em si, na segunda parte do livro, é atrapalhada por algumas coisas. Em primeiro lugar, por uma questão histórica de quando o livro foi escrito, a sociedade apresentada é machista e até escravista. Contudo, isso se perdoa, pois esse machismo e esse escravismo são moderados e até mesmo aceitáveis, especialmente em comparação àqueles que vigoravam na época. Mas, além disso, o próprio cerne da civilização utopiana é um pouco incômodo: todas as cidades são iguais, as pessoas se vestem de maneira igual, tudo é nivelado e asséptico... não me parece um bom lugar para se viver. Porém, mais uma vez, isso não desmerece o livro. Se até Oscar Wilde, um cínico por natureza, disse que um mapa do mundo que não tenha em si a ilha de Utopia não é sequer digno de consulta, é porque o sonho utópico é algo realmente extraordinário, e de fato: o que mais valeu no livro, para mim, foi seu tom sonhador, esse sentimento que percebemos subjacente de querer que as coisas como são melhorem, de saber que nossa sociedade-e-civilização pode sim evoluir, e alcançar um patamar melhor para todos os seres humanos, que respeite as individualidades e as diferenças, mas não deixe de olhar para o todo, para o Outro. Em tempos de um negro filho de imigrantes com nome estranho ser eleito para ser presidente dos EUA, isso é extremamente significativo.
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3 comentários:

Sib disse...

A famigerada ilha de Thomas Morus (!) (demorei para reconhecer porque estou mais acostumada com o Morus - a grafia 'latina' - do que o More).
Estou estudando isso em Filosofia ^^

Sib disse...

não tenho escrito nada digno de nota, não se dê ao trabalho.
(na verdade, eu acho que não consigo mais escrever direito)

João G. Viana/Pudim disse...

Macunaíma rox!
De fato, o mais aproveitável da Utopia é a proposta do sonho, e não a sociedade descrita pelo autor...