terça-feira, 3 de março de 2009

No Tempo das Diligências

No princípio havia John Ford, e então se fez o faroeste. Ford não foi, é verdade, o pioneiro do gênero (que nascera, afinal, nos livros baratos do final do século XIX), mas foi com No Tempo das Diligências, uma de suas obras mais célebres, que o faroeste ganhou suas características clássicas: as panorâmicas das paisagens áridas do sul dos EUA (e mais especificamente o Monument Valley), os tiroteios, as perseguições, os personagens típicos, os apaches e, é claro, John Wayne. Ford uniu influências do que havia de faroeste anterior e condensou nessa obra-prima, que ainda nos deu novos aspectos que se tornariam comuns no gênero.

Diz-se que, enquanto filmava Cidadão Kane, Orson Welles viu No Tempo das Diligências 40 vezes. Não dá pra dizer se isso é mito ou realidade, mas não seria difícil que tal coisa tivesse acontecido. O que Ford fez nesse filme é espantoso. Ele constrói um filme equilibrado com um enredo ao mesmo tempo extenso e limitado, e tratando de diversos temas concomitantemente.

O foco, aqui, está nos personagens, embora haja um bom número de cenas de ação (das quais tratarei mais adiante). E que personagens! Ao todo, são 9 os protagonistas, passageiros de uma diligência que precisa atravessar um pedaço de terra dominado pelos apaches para entregar um recado numa cidade relativamente distante. Cada um representa um tipo tradicional do faroeste: a prostituta, o apostador, o médico, o pistoleiro, o xerife, o caixeiro viajante, o banqueiro... E, mesmo com uma metragem de apenas uma hora e quarenta minutos, todos esses personagens são bem delineados e apresentados, consistentes, enfim, e com personalidades próprias. Por meio deles, Ford toca em temas como o preconceito social, o vício, a lei, a vingança... enfim, aspectos centrais do faroeste.

E além desse talento dramático, há também em No Tempo das Diligências um espaço importante para a comédia e a ação, de novo magistralmente conduzidas pelo diretor. A cena de perseguição no deserto é, sem exagero, uma das mais espetaculares da história do cinema, um primor de ação cinematográfica. Sem recorrer a músicas explosivas ou incidentais, excesso de barulho, explosões ou nada do tipo, Ford filma uma cena perfeita, eletrizante, irretocável. Mais um trunfo para esse filme seminal.

No Tempo das Diligências, portanto, trouxe uma gama de personagens e situações típicos, uma mistura equilibrada de ação, drama e comédia, e até mesmo John Wayne para o western. Mas, mais do que isso, foi a estréia no gênero do maior diretor que filmou o deserto e seus pistoleiros: John Ford, o gênio.
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