No passado, Hitchcock não era visto como um grande diretor pelos críticos, por fazer filmes de suspense, considerado um gênero menor. Foi necessário que um diretor francês, François Truffaut, apaixonado pela obra do britânico, mostrasse ao mundo a genialidade de Hitch. Durante uma semana, eles conversaram dez horas todos os dias, que foram gravadas e posteriormente reunidas em um livro, acabando por convencer a todos que Alfred Hitchcock estava no mesmo patamar de Fellini, Buñuel, Renoir e Bergman, os maiores gênios da Sétima Arte. Nas entrevistas, o diretor de Os Pássaros falava sobre seu processo criativo, seus métodos de filmagem, suas idéias estéticas e, também, sobre o MacGuffin...
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Hitchcock: A famosa cláusula secreta era o nosso MacGuffin. Precisamos falar do MacGuffin!
Truffaut: O MacGuffin é um pretexto, é isso?
Hitchcock: É um expediente, um truque, um recurso para uma situação problemática, é o que se chama um gimmick. Então, a história do MacGuffin é a seguinte. Você sabe que Kipling costumava escrever sobre a Índia e os britânicos que lutavam contra os nativos na fronteira do Afeganistão. Todas as histórias de espionagem escritas nesse ambiente eram invariavelmente sobre o roubo dos planos da fortaleza. Isso era o MacGuffin. Portanto, MacGuffin é o nome que se dá a esse tipo de ação: roubar... os papéis; roubar... os documentos; roubar... um segredo. Na prática, isso não tem a menor importância, e os lógicos estão errados em procurar a verdade no MacGuffin. No meu trabalho, sempre pensei que os "papéis" ou os "documentos" ou os "segredos" de construção da fortaleza devem ser extremamente importantes para os personagens do filme mas sem nenhuma importância para mim, o narrador.
Agora, de onde vem o termo MacGuffin? Ele evoca um nome escocês e pode-se imaginar uma conversa entre dois homens num trem. Um diz ao outro: "O que é esse embrulho que você colocou no bagageiro?". O outro: "Ah, isso! É um MacGuffin". Então, o primeiro: "O que é um MacGuffin?". O outro: "Pois bem! É um aparelho para pegar leões nas montanhas Adirondak". O primeiro: "Mas não há leões nas Adirondak". Então o outro conclui: "Nesse caso, não é um MacGuffin". Essa anedota mostra o vazio do MacGuffin...
(...)
Um fenômeno curioso acontece invariavelmente quando trabalho pela primeira vez com um roteirista; ele tende a concentrar toda a sua atenção no MacGuffin e tenho de lhe explicar que isso não tem a menor importância. Tomemos o exemplo de Os 39 degraus: o que os espiões procuram? O homem que não tem um dedo?... E a mulher no início, o que ela procura?... Será que ela chegou tão perto do grande segredo que foi preciso apunhalá-la pelas costas no apartamento de outra pessoa?
Truffaut: É que deve haver uma espécie de lei dramática quando o personagem está realmente em perigo; durante o seu percurso, a sobrevivência desse protagonista passa a ser tão preocupante que o MacGuffin é completamente esquecido. Mas, seja como for, deve haver um perigo, pois em certos filmes, quando se chega, no final, à cena da explicação, portanto quando se revela o MacGuffin, os espectadores debocham, vaiam ou reclamam. Mas creio que uma de suas astúcias é revelar o MacGuffin, não bem no finzinho, mas após dois terços ou três quartos de filme, o que lhe permite evitar um final explicativo.
Hitchcock: Meu melhor MacGuffin -- e, por melhor, entendo o mais vazio, o mais inexistente, o mais irrisório -- é o de Intriga internacional. É um filme de espionagem e a única pergunta feita pelo roteiro é: "O que procuram esses espiões?". Ora, durante a cena no campo de aviação em Chicago, o homem da CIA explica tudo a Cary Grant, que lhe pergunta, referindo-se ao personagem de James Mason: "O que é que ele faz?". O outro responde: "Digamos que é um sujeito que faz export-import". "Mas o que é que ele vende?" "Ah!... só segredos do governo!" Você vê que, aí, reduzimos o MacGuffin à sua mais pura expressão: nada.
sábado, 2 de agosto de 2008
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