sábado, 23 de fevereiro de 2008

Defina Vida

"Tão cedo passa tudo quanto passa!
Morre tão jovem ante os deuses quanto
Morre! Tudo é tão pouco!
Nada se sabe, tudo se imagina.
Circunda-te de rosas, ama, bebe
E cala. O mais é nada."
Ricardo Reis/ Fernando Pessoa

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Acho extremamente redutivas as sentenças que tentam condensar a vida em uma mera relação de ser ou não alguma coisa. A vida é isso, a vida é aquilo. Sentenças como “a vida é feita de momentos” são válidas, mas são somente uma minúscula faceta de um todo praticamente infinito. A vida é uma coisa, perdoem a expressão, viva, ou seja, ela existe agora, está em movimento, ressurge e muda a cada instante. Desse modo, as verdades sobre a vida se acumulam e se sobrepõem.

Um exemplo disso são os ditados, famosas “pérolas da sabedoria popular” que, entretanto, são extremamente contraditórios. O que está mais correto: “melhor um pássaro na mão que dois voando” ou “quem não arrisca não petisca”? “Os olhos são as janelas da alma” não? Mas não está correto que “quem vê cara não vê coração”? E por aí vai, os exemplos se multiplicam. Isso não quer dizer que os ditados populares não têm valor, mas tentar reduzir a multiplicidade da vida a uma tabela de situações que se repetem chega a ser ridículo.

Tentar definir a vida é cair no vazio, porque para cada sentença “sim”, há uma sentença “não”. A vida é feita de alegrias, mas também de tristezas. A vida é feita de conquistas, mas também de tropeços. Ela é feita de sonhos, e também de realidade. De espera, de gozo, de sofrimento. A vida é uma coisa tão grande porque são muitos os que vivem, e para cada novo “vivente” acrescentado à equação, mais complexa ela se torna. Todos tem sua verdade, que só serve para si mesmo e que é correta.

Voltando à nossa sentença inicial, dizer que “a vida é feita de momentos” é muito justo: são os momentos, as partes da vida editadas, que permanecem em nossa memória. Mas, por outro lado, o melhor da festa é esperar por ela, e ignorar a travessia, considerar só os inícios e os finais, é perder tudo que o viver nos oferece. O que importa não é o destino, mas a viagem.

Até porque a única verdade aparente sobre a vida é que ela é finita (daí o destino final de todos, a morte) e única. Por isso tantos disseram, com palavras diferentes, que só se vive uma vez: viver é desenhar sem borracha, a vida não tem rascunho, etc. Mas, ainda assim, estamos nos baseando somente no provado, no conhecido. É semelhante à sentença científica de que a vida começa na concepção e acaba quando todos os órgãos deixam de funcionar (e mesmo aí há muita discussão). Não se sabe, nem há como provar, se existe ou não vida após a morte. Ambas são possibilidades, e igualmente assustadoras. Qualquer uma que se concretizasse como verdadeira traria mais mal do que bem.

Jesus, Buda, outros grande sábios (esses foram os maiores), falaram sobre a verdade estar no meio. De modo semelhante, o físico Niels Bohr tinha por lema que "Há verdades triviais e há grandes verdades. O oposto de uma verdade trivial é simplesmente falso; O oposto de uma grande verdade, também é verdadeiro.", frase que vocês podem ver lá embaixo nesse blog, e é uma das minhas grandes crenças, uma idéia que realmente marcou minha vida.

Porque a vida não é (lá vou eu fazer o que acabei de criticar) um sistema fechado, concreto e absoluto. A vida é, simplesmente, feita do possível, de cada minúscula coisa que pode ser feita, que pode ser verdade. A incerteza é o maior trunfo da vida, é sua grande definição. E abraçá-la, se entregar à infinitude do possível, é viver todas as vidas quantas sejam possíveis de serem vividas.

Um comentário:

Francisco disse...

Qualquer frase que tente definir a vida, sem dúvida é, apenas uma face do polígono de infinitos lados que esta é [e esta frase se inclui].
Uma face não exclui a outra, pelo contrário, ajuda a completá-la.

Não que o que importa seja a viagem, e não o destino, mas o destino só é bem aproveitado se a viagem também for desfrutada ao máximo, na minha opnião.

E um fato curioso, é que duvido você a me mostrar UMA frase que não seja verdadeira, que fale sobre a vida.