quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

A Roda #6 - Adeus Ano Velho







por Lobato Légio

Vão-se os anos: as lembranças ficam. Ao menos por enquanto. Hoje, nesse décimo dia de dezembro desse ano de doismileoito, escrevo pela última vez no diário-de-rede Amortescimento. Eu, o Lobato Légio de doismileoito, o Lobato Légio com essa contagem de anos, não voltará a escrever aqui. Só quem vocês poderão ouvir, a partir do decimoquarto dia de doismilenove, será o novo Lobato Légio, o Lobato Légio do anoquevem, um outro.

Esse de agora, porém, tem ainda algo que dizer. O doimileoito que se arrasta para o não-mais-ser foi um ano pleno de mudanças para os dedos que tanto anunciam: no princípio um kaos, então kalmaria, e por meios movimento (posto que não chegou ainda o Fim), como cabe aos mitos de todas as línguas.

O primeiro dos dias de Janus perdeu-me numa distensão em que o passado e o futuro, afrente e atrás, eram concomitantemente assimilados pela minha consciência. Por “assimilados” e “consciência”, porém, digo somente que tais coisas caíam sem aviso no mar-revolto que meus pensamentos se haviam tornado.

Por todos os primeiros meses, tal continuou acontecendo. Numa imagem que pode facilitar a apreensão do que eu sentia: sendo minha cabeça uma imensa biblioteca, era como se todas as prateleiras houvessem sido viradas e os livros assim idos ao chão, misturando-se em princípio, confundindo-se depois e ao cabo queimando como uma Alexandria assaz pessoal e singular.

Uma garoa fina, todavia, soprada talvez pelos deuses beneméritos, veio sobre mim aplacar as chamas e esfriar os destroços. Após o que resolvi abandonar todos os meus projetos e haveres e mudar-me para uma solitária cabana no campo. Ali pelos vários dos meses morei, até que um velho da aldeia indicou ao Tuma dono deste local virtual o caminho até minha cabana, e o moço solene veio até mim.

Da maneira que já tratei, o rapaz convidou-me para escrever em seu diário-de-rede, com donaires de grande intento, convite do qual declinei gentilmente. As Moiras, porém, nos enredam de maneiras que mal concebemos, e por motivos os quais não é de meu interesse comentar vim morar aqui em terra brasilis, Pindorama para os íntimos.

A isto, seguiu-se que achei por bem aceitar o convite de Tuma, e passei a escrever “aqui” no Amortescimento a cada duas semanas (constância que se manteve, salvo uma única exceção). Conquanto não tenha, é fato, tratado ainda diretamente de temas mais específicos, já vi publicadas aqui três descrições geoandrográficas das terras (em) que sou, e recebi com alegria os comentários feitos a respeito de meus escritos.

A hora, porém, é de melancolia. Estive com vocês, meus leitores, por durante seis longos séquitos letrados, mas doismileoito não lerá mais minhas palavras. O que vem agora, portanto, é despedida, um único “Adeus”, lacônico e franco, para os que com coragem me acompanharam.

Minha personalidade semovente, pois, há-de estar em um outro lugar que não o de-hoje aqui, quando Lobato Légio voltar a escrever. Ter(ei/emos/ão) dado mais um passo em direção ao Fim, conquanto não (me/nos/lhes) será dada a chance de chegar até o momento último, quando A Roda parar de girar a contagem dos anos voltar a zero e todos os atos lembranças palavras sentidos se desfizerem em brancura.

Assim, com imensa tristeza mas esperançoso de uma outravez nos encontrarmos, digo o que é preciso dizer:

Adeus.
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