sexta-feira, 10 de abril de 2009

A Roda #18 - Tratado Universalizante da Xurepa, Parte 1: O Significado da Xurepa - A Xur-Lírica: Ouvi-La com a Alma


por Lobato Légio

Se a Xur-Épica contempla e estuda as trevas do abismo em que nos encontramos, e xurepicamente espera ser contemplada de volta, a Xur-Lírica busca lançar uma luz nesse abismo, nas trevas do mero ser, e iluminar os laços que unem as coisas com uma cor cálida e próxima. De fato, a Xur-Lírica é a mais pessoal das abordagens da Xurepa, justamente por ser, toda ela, pessoal e intransferível. No capítulo anterior, foi dito que as relações – xurépicas – entre as coisas poderiam ser representadas por linhas que as ligassem. Pois bem: a Xur-Lírica nada mais é que a contemplação, por um ser consciente, das linhas que saem de si próprio e o ligam às demais coisas do Universo.

Por ela se explica o mais valoroso conceito do ser humano: a experiência pessoal. Pois, se cada um vê as linhas que saem de si, cada um tem uma visão particular do Mundo: o emaranhado das linhas xurépicas que constituem a existência se apresenta a cada ser de maneira única. As linhas da Xurepa não ligam somente coisas materiais, mas as imaterias também. Um ser consciente é ligado às suas idéias, às idéias dos outros, às coisas que não conhece, e cada uma dessas linhas tem um significado próprio. Mas esse significado só é apreensível para aquele que a vê de determinado ponto. Alguém que observe uma linha ligando duas pessoas distintas terá uma determinada idéia sobre ela, e cada uma das pessoas nas extremidades da linha terá uma visão diferente, tanto daquele que se encontra na outra ponta quanto do observador passivo.

Aí se encontra a raiz da solidão, e aí a raiz da poesia. Tendo um ser humano uma visão única das coisas, ele é, até as últimas conseqüências, único, e sua experiência é também única, e intransferível, o que, em princípio, e ao menos em certos momentos, instantes que pontuam sua passagem pela Terra, o isola. Mas, se o todo é inimitável, dois seres conscientes podem ter uma visão similar de certas linhas, e portanto se aproximarem. O relacionamento humano, assim, é a busca por linhas que se sobreponham – seja por serem coincidentes, seja por se completarem. Quanto mais linhas sobrepostas entre dois seres, maior a proximidade entre eles, maior a ligação entre suas almas. Nem sempre o ser humano é capaz de divisar a sobreposição das linhas, ou entender conscientemente o significado delas. Mas elas estão ali, à espera da descoberta.

A poesia, por sua vez, é a tentativa de expressão da visão Xur-Lírica. Em sua solidão, em última instância, incontornável, o poeta quer que os outros compreendam sua própria visão, ou também querem se colocar em outro ponto de observação, querem se deslocar para outra convergência de linhas, donde poderão entender o que, de sua perspectiva trivial, não entendem. Desnecessário comentar sobre quais seriam as principais manifestações da Xur-Lírica na sociedade humana: ela está em toda parte. Cada ser consciente que se apercebe de sua singularidade, de seu lugar único em relação ao mundo, cada ser humano que se vê sozinho, incompreendido, cada pessoa que tenta dividir com os outros sua própria visão, seja por palavras, seja por gestos, seja por algum outro meio ainda não notado mas presente no decorrer dos dias, esse ente descobre a Xurepa, e a vivencia, e a espalha.
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Um comentário:

Ana Paula Brasil disse...

Gostei muito do Tratado Universalizante da Xurepa e do desenvolvimento sobre as concepções Xur-Líricas e Xur-Épicas. Sinto-me xur-liricamente atrelada! Vou acompanhar os novos estudos da sua palavra-enigma. :)